Fundos rotativos solidários: avanços e limites para a construção de finanças solidárias no Brasil

Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política, Florianópolis

Roque Ademir Favarin, 2018

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Compendio :

Os Fundos Rotativos Solidários (FRS) são poupanças coletivas para suprir determinadas necessidades dos seus participantes ou de outros grupos ou famílias mediante o consenso de regras acordadas pelos integrantes dos Fundos. Eles mobilizam, organizam e emprestam recursos a pequenos projetos coletivos e alternativos, como empreendimentos econômicos solidários, mobilizações sociais ou atividades formativas. São rotativos porque apresentam algum tipo de devolução de recursos . Também são considerados instrumentos de Finanças Solidárias que, em tese, praticam a autogestão, formando uma poupança voluntária e reinvestem em prol da própria comunidade. Os recursos circulam na própria comunidade e a reposição desses fundos obedece a uma lógica da solidariedade e a regras de reciprocidade. As origens dessa prática financeira se inspiram em diversas modalidades de microfinanças, que remontam à década de 1980, impulsionados pela ascensão de movimentos sociais na redemocratização do Brasil e pelo apoio financeiro a setores onde havia ausência de crédito. O avanço dessas experiências contribui para o surgimento da Economia Solidária, entre os anos 1990 a 2000. Na década mais recente, tais práticas foram impulsionadas inclusive por programas governamentais e pela articulação de organizações populares em torno da Economia Solidária. Neste processo, inserem-se os FRS, as Cooperativas de Crédito Solidário, os Bancos Comunitários de Desenvolvimento e o uso de moedas sociais passa aintegrar um campo teórico e político denominado Finanças Solidárias. Essas formas de financiamento procuram se diferenciar dos atuais programas de microcrédito, que priorizam as microempresas capitalistas. Visto isso, o aporte teórico que baseia este trabalho situa as Finanças Solidárias na teoria da Dádiva, de Mauss; na Reciprocidade, de Polanyi; e na concepção marxista de emancipação; pressupondo que tais concepções acrescentam outro significado ao conceito Solidário, comumente entendido como assistencialismo ou caridade. O problema teórico posto é analisar em que medida os FRS conseguem ser um instrumento de emancipação dos grupos sociais envolvidos. Para responder esta questão, a metodologia deste trabalho se utilizou de dados e informações dos 539 Fundos considerados no Mapeamento dos Fundos Solidários realizado pela Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES) no Brasil entre 2011 e 2013. Desse universo, foram considerados para análise 270 fundos rotativos solidários que utilizam a devolução financeira, divididos entre comunitários e de fomento . Do total avaliado, 193 FRS estão inseridos no meio rural, sendo a maioria comunitários e organizados por associações de agricultores familiares (142) seguidos de assentados, apicultores, pescadores, indígenas e quilombolas. Em menor número, 33 FRS são urbanos e incluem artesãos, costureiras, sem-tetos entre outros; e, finalmente, 44 são caracterizados como FRS de Fomento, gerenciados por entidades de maior abrangência geográfica de atuação. A análise considerou quatro aspectos principais em relação aos fundos: i) a captação de recursos; ii) gestão; iii) atividades que são financiadas; e iv) principais conquistas e dificuldades. Constatou-se que grande parte dos Fundos operam com recursos próprios, mas é expressivo o aporte de diferentes entidades sociais, ONGs e organizações estrangeiras. A análise da gestão, considerou especialmente o envolvimento dos participantes, identificou que há participação mais significativa em Fundos Comunitários, e predomina o financiamento de empreendimentos coletivos da Economia Solidária. Entre as principais conquistas situam-se a melhoria da qualidade de vida, o aumento da renda e a atuação coletiva. As principais dificuldades constatadas estão nas escassas ações relacionadas a políticas públicas de finanças solidárias, a inadimplência, a falta de recursos e à baixa participação dos membros na gestão dos Fundos. Com isso, conclui-se que os FRS, por serem práticas creditícias menos complexas, facilitam a emancipação via autogestão coletiva dos recursos de tais grupos sociais excluídos, principalmente os comunitários, nos quais as relações sociais baseiam-se na confiança que se traduzem na Dádiva e Reciprocidade. E, mais, que sua viabilidade econômica, social e política depende de uma rede de movimentos sociais articulada à sua base social, que contribui para avanços na emancipação política e humana. Enfim, de modo geral, considera-se que os FRS contribuem para emancipação enquanto metodologia pedagógica, utilizando-se do crédito solidário como um instrumento , alternativo, ao hegemônico sistema financeiro capitalista.

Fonti :

repositorio.ufsc.br/handle/123456789/193317